Santa Catarina precisaria investir R$ 3,71 bilhões para recuperar rodovias, com ações emergenciais e de manutenção. A situação das estradas federais e estaduais do estado foi analisada pela Confederação Nacional de Transportes (CNT), que apontou, em pesquisa divulgada na última semana, que 72% da malha rodoviária pavimentada apresenta algum tipo de problema.
A precarização das estradas catarinenses é apontada, há anos, como problema crítico por setores produtivos, que pedem soluções urgentes. Concessão de rodovias e parcerias público-privadas (PPPs) são citadas como alternativas, sob risco de o estado "ter limitação de crescimento por falta de infraestrutura adequada", sentencia o presidente da Federação das Empresas de Transporte de Cargas de Santa Catarina (Fetrancesc), Dagnor Schneider.
O estado depende de rodovias para escoar produções, principalmente do oeste até os portos, no litoral. São as vias dessas regiões, como a SC-283 e a SC-350, que têm maior defasagem, aponta o presidente da Câmara de Transporte e Logística da Fiesc, Egídio Antônio Martorano, que defende as concessões das vias para garantir qualidade.
Com rodovias em más condições, o custo operacional do transporte fica 37,1% mais caro e afeta a competitividade do Brasil, de acordo com a CNT.
O percentual é o maior da região sul: Paraná tem 29% e Rio Grande do Sul, 33,6%. "Não temos infraestrutura rodoviária de acordo com a economia. (A qualidade das vias) está muito aquém. Isso gera prejuízos para competitividade, gera prejuízos pelos acidentes", ressalta Martorano.
Só em 2022, aponta a pesquisa da CNT, o prejuízo gerado por acidentes de trânsito foi de R$ 1,37 bilhão no estado catarinense. "No mesmo ano, o governo gastou R$ 146,95 milhões com obras de infraestrutura rodoviária de transporte", cita o relatório. Em rodovias federais, Santa Catarina registrou 7.570 acidentes, o segundo maior número do país, com 350 mortos, de acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Minas Gerais teve o pior resultado, com 8.262 acidentes, que provocaram 699 mortes.
Além disso, dados do Registro Nacional de Acidentes e Estatísticas de Trânsito (Renaest), da Secretaria Nacional de Trânsito do Ministério dos Transportes, apontam para um total de 168.604 acidentes em território catarinense no último ano, com 925 óbitos (esses números excluem os dados da PRF e incluem trechos urbanos).
Concessões estão em fase de estudo e esbarram em promessa de Jorginho Mello
Com o ajuste fiscal do governo federal, Santa Catarina precisa diversificar as fontes de recursos para recuperar e manter as rodovias, avalia Martorano. Uma das alternativas é a concessão de estradas à iniciativa privada, que está em fase de estudos e começou a ser discutida no fim de 2021.
O Ministério dos Transportes analisa a viabilidade econômica da concessão de 1.647,30 quilômetros de rodovias federais e 1.506,07 quilômetros de estaduais.
A concessão seria de 30 anos e envolveria capex de R$ 30 bilhões – esse valor inclui o volume de investimento, geralmente no início do projeto, e o custo mensal de manutenção operacional. Além disso, o governo federal estima 442.652 empregos entre diretos, indiretos e efeito-renda.
De acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), "pelas rodovias integrantes do estudo circulam produtos destinados aos principais portos da região, Paranaguá/PR, Itajaí/SC, Imbituba/SC, Navegantes/SC, São Francisco do Sul/SC e Santos/SP, além de abastecer com produtos cidades importantes dos estados de Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul e países membros do Mercosul. Também se destaca o fluxo destinado ao turismo, tanto interno quanto do exterior, com destino às praias catarinenses".
No entanto, essa medida não deve ser implementada a curto prazo. O ministro dos Transportes, Renan Filho, informou em visita a Santa Catarina que provavelmente não terá concessão de rodovia antes de 2025, relata o presidente da Fetrancesc, Dagnor Schneider, que estava no encontro. Além disso, o projeto de concessão de rodovias catarinenses está na fase de estudos, que é a primeira etapa. Faltam ainda audiências públicas para debater o assunto, análise do Tribunal de Contas da União (TCU), lançamento do edital, leilão de projeto e, por último, assinatura do contrato. Outros estados estão com esse processo mais avançado.
Soma-se às burocracias um impasse envolvendo a promessa de campanha do governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), que disse que não colocaria pedágios nas rodovias estaduais, as SCs. Nos bastidores, o que se diz é que ele não voltará atrás e que o assunto, neste momento, não é prioridade. No entanto, Jorginho não tem objeções à concessão de rodovias federais.
Contudo, no entendimento do Ministério dos Transportes, "a junção dos sistemas federal e estadual é o modelo mais vantajoso". Em nota, a pasta ressalta que "todo o processo de discussão será conduzido em parceria com representantes do governo de Santa Catarina e da sociedade catarinense, nos mesmos moldes dos dois lotes de rodovias do Paraná que já foram concedidos".
Rodovias federais analisadas para concessão em Santa Catarina:
BR-153
BR-158
BR-163
BR-280
BR-282
BR-470
BR-480
Rodovias estaduais de Santa Catarina analisadas para concessão:
SC-108; SC-110; SC-114; SC-120
SC-135; SC-155; SC-157; SC-163
SC-280; SC-283; SC-350; SC-355
SC-370; SC-386; SC-410; SC-412
SC-416; SC-417; SC-418; SC-421
SC-445; SC-452; SC-453; SC-480 e SC-486
Programa do governo catarinense promete revitalizar rodovias
Parte das rodovias estaduais que estão em análise pelo governo federal para concessão consta em uma lista de revitalização do programa Estrada Boa, do governo de catarinense, lançado em agosto. Essa ação prevê 60 obras em todas as regiões de Santa Catarina na área da infraestrutura, com investimento total de R$ 2,1 bilhões, dos quais R$ 1,5 bilhão em obras estruturantes e R$ 665 milhões em revitalização.
De acordo com o governo do estado, a ação irá restaurar, implantar e revitalizar 1.504 quilômetros de estradas estaduais. Esse número representa 25% dos cerca de 6 mil quilômetros de toda a infraestrutura rodoviária no estado. Os critérios para definição dos trechos foram, segundo o governo estadual, grau de degradação da rodovia, demanda de tráfego, projeto e orçamento revisados, licenças emitidas e desapropriações em andamento.
Para o presidente da Câmara de Transporte e Logística da Fiesc, Egídio Antônio Martorano, o investimento do programa é significativo e pode trazer benefícios, mas aponta que, para sentir as melhoras, "vai demorar um pouco". Ele demonstra ainda preocupação com a manutenção dessas vias. "Pode até fazer uma nova, mas nossa preocupação é que se mantenha essas rodovias, com concessão e PPP", diz, ressaltando que recuperar uma vida é cinco vezes mais caro do que mantê-la.
Outros pontos do estudo da CNT sobre as rodovias catarinenses
A Pesquisa CNT de Rodovias avaliou 3.515 quilômetros em Santa Catarina, entre rodovias estaduais e federais, o que representa 3,2% do total pesquisado no Brasil.
Estado geral das rodovias: 72% da malha rodoviária pavimentada avaliada do estado apresenta algum tipo de problema, sendo considerada regular, ruim ou péssima; 28,0% da malha é considerada ótima ou boa.
Pavimento: 59,7% da extensão da malha rodoviária do estado avaliada apresenta problemas; 40,3% tem condição satisfatória; 0,1% está com o pavimento totalmente destruído.
Sinalização: 69,8% da extensão da malha rodoviária da região é considerada regular, ruim ou péssima; 30,2%, ótima ou boa; 3,2% está sem faixa central; e 11,0% não tem faixas laterais.
Geometria da via (traçado): 69,3% da extensão da malha rodoviária do estado apresenta algum tipo de problema; 30,7% está ótima ou boa; as pistas simples predominam em 83,4%; falta acostamento em 54,1% dos trechos avaliados; e 22,8% dos trechos com curvas perigosas não têm sinalização. Pontos críticos: a pesquisa identificou 34 no estado.
Custo operacional: as condições do pavimento no estado geram um aumento de custo operacional do transporte de 37,1%, o que se reflete na competitividade do Brasil e no preço dos produtos.
Investimentos necessários: para recuperar as rodovias em Santa Catarina, com ações emergenciais (reconstrução e restauração) e de manutenção, são necessários R$ 3,71 bilhões.
Custo dos acidentes: o prejuízo gerado por acidentes foi de R$ 1,37 bilhão em 2022. No mesmo ano, o governo gastou R$ 146,95 milhões com obras de infraestrutura rodoviária de transporte.
Meio ambiente: em 2023, estima-se que haverá um consumo desnecessário de R$ 37,7 milhões de litros de diesel devido à má qualidade do pavimento da malha rodoviária no estado. Esse desperdício custará R$ 248,15 milhões aos transportadores.
Investimentos: do total de recursos autorizados pelo governo federal para a infraestrutura rodoviária, especificamente em Santa Catarina, em 2023 (R$ 693,85 milhões), foram investidos R$ 405,36 milhões até setembro (58,4%).
Fonte: Raphaela Suzin / Gazeta do Povo?